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NEM TODA ADAPTAÇÃO É NECESSÁRIA

EberAnacletoNEM TODA ADAPTAÇÃO É NECESSÁRIA

Publicado: 18-09- 17


Colunista: Éber Anacleto, apresentador, Radialista &; jornalista, analista em mídias sociais e palestrante.


Foto: Edi Souza


PraCegoVer:Eber anacleto é moreno de estatura mediana tem cabelos curtos e veste camisa social cor goiaba e estar de braços cruzados e sorrindo
 

 Uma manhã fria e lá estava eu com o celular lendo algumas notícias e e-mails, quando um e-mail bem revoltado me chamou a atenção.

A pessoa escrevia com críticas ferrenhas sobre uma adaptação de pratos e talheres para cegos que fora idealizado por um senhor deficiente visual de Teresina, chamado Carlos Amorim. Segundo esse senhor, em um jantar num restaurante onde os cegos jantavam felizes, uma jovem cega derramou a sopa em sua roupa. Carlos até comentou algo interessante ainda mais se tratando de mulher, ele disse que ’O acontecido trouxe constrangimento e comentários desagradáveis de pessoas que não entendem as dificuldades de quem é cego;

Logo fiquei pensando na vergonha da moça, poxa sujar a roupa com sopa, já reparou o desespero das mulheres quando estão nesses locais e deixam cair alguma coisa na roupa ou até mesmo nos cabelos? Parece que o mundo vai acabar e elas ficarão horríveis para sempre!

Mas, fiquei muito curioso para saber que grande, tamanha adaptação era essa que estava causando revolta e desespero da comunidade cega a qual faço parte?

Rapidinho vou para o Google e vem alguns resultados que comecei a ler para entender.

O exuberante invento era uma barra metálica soldada na borda do prato para que o pobre cego não derrame a comida e tenha a referência de onde acaba o pratinho da comidinha. Ah, e não é só isso! “Nossa pareceu 1406”! Mas vamos lá não é uma propaganda tão séria.

A famosa barra metálica, servia também como apoio para colocar a comida nos talheres. Sei lá, parece que nós cegos levamos a comida até o fim do prato para saber que já podemos tirar o garfo para colocar na boca. Bem, bem, estranho.

E não para por aí, tem mais! As ferramentas para comer, os talheres que também seriam adaptados ajudam o cego saber a posição correta dos acessórios. Uma bolinha foi instalada na colher, garfo e faca.

Logo pensei que em se tratando dos talheres, era até bom. Eu que sou meio desatento muitas vezes me peguei colocando a faca na boca pensando que era garfo! Acho que as pessoas no restaurante ficavam atônitas, “Meu Deus, o ceguinho vai cometer suicídio aqui, no almoço mesmo”! Quando eu percebo a loucura por estar pensando em outras coisas, disfarço e saco o celular para fingir que foi ele que me tirou a atenção, bendito celular.

A coisa ficou séria quando esse senhor disse que estava trabalhando junto com a vereadora Cida Santiago, do PHS, para aprovação do projeto de lei que obrigaria os lugares que comercializam alimentos terem os pratinhos e talheres adaptados para os ceguinhos. Naquele momento pude entender a revolta e me solidarizei com todos.

Mais calmo depois de um dia corrido, fiquei pensando enquanto tomava o décimo quinto café do dia. Claro que para a maioria não seria necessária uma adaptação dessas nós temos a noção do espaço do prato e dá para saber a posição dos garfos, facas e colheres; claro, desde que não seja distraído igual a uma pessoa que conheço... deixa para lá.

Só que conheço cegos que faria bom uso dessas adaptações. Há cegos que deixam quase a metade da comida por acreditar que já comeu tudo, não tem muita noção do espaço do prato. Outros seguram os talheres errados e vira uma confusão só.

Isso para arrumar, é só um bom curso de atividades da vida diária, (AVD), que ensinará tudo desde limpar uma casa até como comer, bendito curso que fiz, mas claro, odeio limpar casa e cozinhar.

Essa adaptação seria ideal para as criancinhas cegas, acredito que facilitaria para a família ensinar como comer e entender o espaço dos pratos e posição dos talheres. Precisamos entender que independente de cego ou não, cada um de nós temos algumas limitações e exige-se uma atenção a mais.

Lembro-me de uma namorada que tive, ela era baixa visão, enxergava uns 20% e sua irmã com o cunhado eram cegos iguais a mim. Começo de namoro, aquela paz que só o amor no começo trás, entre beijos ela me disse bem romântica que me levaria para conhecer a família dela aqui em SP. Claro, já fiquei apreensivo, poxa o negócio estava ficando sério mesmo!

Não houve escapatória, uma noite de calor em um sábado, lá fui eu bem arrumadinho, cheirosinho para casa da irmã dela. Era um jantar, e eu nunca havia passado por aquela situação, fui preparado para um arroz talvez meio cru, um uma lasanha meio queimada pelo menos nas bordas, mas em fim era minha namoradinha meu estômago que se virasse depois.

A conversa com o cunhado dela ia muito bem, e o cheiro da cozinha cada vez mais gostoso e sempre ela vinha com muito carinho trazer mais um pouco de vinho e tudo muito lindo. Então foi dado o ultimato! “Gente jantar na mesa, vem meu amor”!

Para minha surpresa, ao lado do prato estava tudo certinho, garfo, faca, taça de vinho meio para esquerda, tudo bonitinho. A lasanha, estava impecável! Só não comi muito para não fazer a vez de cego esfomeado, mas estava tudo muito bom.

Foi aí que comecei a questionar as duas. Como faziam, quais as adaptações elas tinham? E elas foram explicando os detalhes e pude perceber que não havia nenhuma adaptação, elas que se adaptaram as coisas que elas tinham na cozinha.

A ideia do rapaz até foi interessante, mas no projeto de lei obrigar os restaurantes, lanchonetes terem essas mágicas adaptações? Me bateu um desespero, eu que sou viciado em café logo pensei entrando tremendo por falta da cafeína em alguma lanchonete e alguém me empurrando para fora gritando: “Desculpa rapaz, mas aqui não temos xícaras adaptadas para cegos viciados em café. Veja se na próxima lanchonete você encontra”.

Será que não seria muita adaptação para nós não? Um sonho, tudo adaptado para os cegos, talvez seria a cidade Cegolândia, aqui o escuro é só um detalhe. Sinceramente, acredito que seria mais uma barreira que teríamos que enfrentar.

Parece-me que nem toda adaptação se faz necessária, em alguns casos precisamos nos adaptar ao mundo lá fora e aprender sempre.

Outras informações :
Éber Anacleto
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