Economia Compartilhada nova mentalidade de negócios no Brasil 4 Artigo
A Polêmica do Airbnb no Brasil. Nossa atual legislação trabalhista, não prevê em seus artigos a chamada economia compartilhada.
Publicado:03/04/17
Colunista: Bernardo Santos é consultor empresarial. Sócio fundador da Forte BS
há anos presta consultoria a empresários nos ramos contábil, fiscal, departamento pessoal, abertura e encerramento de empresas, alterações contratuais, registro de patentes e marcas, tecnologia, entre outros temas. Está se especializando em Direito Cibernético e Compliance
Foto: Edi Sousa Studio Artes.
Existe um modelo de negócios chamado Peer-to-peer (P2P), ou ponto-a-ponto, que é baseado numa arquitetura de redes de computadores. Esta arquitetura permite que cada um dos pontos da rede funcione tanto como cliente (que envia a mensagem) quanto como servidor (que recebe a mensagem); assim, o compartilhamento entre a rede dispensaria um servidor central ou um intermediário entre os pontos da rede.
Baseado nessa modalidade de rede P2P, criou se uma nova mentalidade de negócios, que vem tomando proporções extraordinárias na rede mundial de computadores, a Internet, e vem sendo utilizada em larga escala por empresas e pessoas comuns movimentando milhões de dólares no mundo todo. Essa modalidade tem sido conhecida como economia compartilhada ou economia de compartilhamento; e uma das empresas que se utiliza deste modelo e vem chamando a atenção nesse mercado é o Airbnb, empresa que abordaremos nesse texto.
Vejamos primeiro o que é Airbnb (e que serviços são oferecidos), antes de entrarmos no assunto da polêmica que o envolve.
Segundo a própria empresa, o Airbnb é uma plataforma para as pessoas anunciarem, descobrirem e reservarem acomodações, ou seja, não há em nenhum momento um contrato de locação com o hóspede, e sim uma intermediação entre o hóspede e o anfitrião. Como podemos ver :
(...) Fundado em agosto de 2008 e com sede em São Francisco, Califórnia, o Airbnb é um mercado comunitário confiável para pessoas anunciarem, descobrirem e reservarem acomodações únicas ao redor do mundo, seja de um computador, de um celular ou de um tablet.
Não importa se você precisa de um apartamento por uma noite, um castelo por uma semana ou um condomínio por um mês: o Airbnb conecta as pessoas a experiências de viagem únicas, preços variados, em mais de 65.000 cidades e 191 países. Com um serviço de atendimento ao consumidor de nível internacional e uma comunidade de usuários em crescimento constante, o Airbnb é a maneira mais fácil de transformar seu espaço extra em dinheiro e mostrá-lo para milhões de pessoas.
Fonte: www.airbnb.com.br
Ainda dentro do contexto de esclarecimento sobre o Airbnb, podemos verificar que é uma plataforma que compartilha a informação, conectando quem tem o imóvel ou espaço a quem quer o imóvel ou espaço. Como já foi dito acima, essa é um característica primordial dos negócios de modelo Ponto a Ponto ou Negócios de Compartilhamento.
No Brasil, o Airbnb tem enfrentado resistência por parte de especialistas jurídicos e das áreas do setor de hotelaria, vejamos alguns pontos polêmicos dessa discussão:
Noticia do Jornal
(...) A defasada legislação trabalhista no Brasil pode complicar o futuro da economia compartilhada. Novas tecnologias como Uber, Airbnb, Cabify entre outras devem enfrentar muitos desafios legais, segundo especialistas.
Fonte : http://www.siqueiracastro.com.br/Noticias/SCAMidia/DCI-Inseguranca juridica_ronda_servicos_de_compartilhamento-23-02-2017.pdf
Conforme noticiado pelo Jornal O GLOBO, o governo brasileiro chegou a propor ao Mercosul que avaliasse tributar serviços digitais de turismo. Discussões de como isso deveria ser feito, bem como discussões com representantes do Airbnb já se iniciaram.
Fonte : http://oglobo.globo.com/economia/alugueis-de-imoveis-ou-quartos-por-meio-sites-poderao-ser-tributados-16835357
Segundo o diretor de legislação do inquilinato do Secovi-SP (sindicato que representa companhias do setor de imóveis) Jaques Bushatsky, a discussão em torno do Airbnb é grande, e deve durar ainda algum tempo, e a maior complicação é sobre como regulamentar e como tributar.
Algumas questões levantadas por conta destas discussões:
Um condomínio residencial deve ser forçado a aceitar um trânsito semanal de pessoas diferentes? É possível barrar o Airbnb se o condomínio não quiser?
Há ainda a preocupação com a responsabilidade civil do Airbnb, justificada por alguns casos extremos e realmente bizarros que ocorreram em várias partes do mundo: um dos mais emblemáticos, por exemplo, é um caso de um cidadão que chegou a falecer devido a uma falha de segurança que gerou vazamento monóxido de carbono. Caso isso ocorresse no Brasil, quem seria o responsável? O Airbnb ou o proprietário? Se o Airbnb fosse em um hotel, este seria responsável, pois estaria oferecendo um serviço.
Outro problema que o Airbnb poderá enfrentar é a nossa atual legislação trabalhista, que não prevê em seus artigos a chamada economia compartilhada, como ocorreu em um julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3), que reconheceu o vínculo de trabalho entre um motorista que oferece serviço pela Uber e a empresa. O relator do caso, juiz da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Marcio Toledo Gonçalves, baseou sua decisão no artigo 3º da CLT, que considera como empregado quem presta serviço de natureza não eventual, sob dependência dos empregados e mediante salário. Decisões parecidas poderiam ser usadas para modelos de negócios parecidos com o Uber e o Airbnb, por exemplo. Vejamos o que o juiz declarou em seu julgamento:
(...)Em sua argumentação, o juiz de Belo Horizonte também apontou o fenômeno que chamou de uberização das relações laborais, às quais atribui tanta importância social quanto o surgimento do fordismo no início do século XX. [
] assistimos ao surgimento de um fenômeno novo, a uberização, que, embora ainda se encontre em nichos específicos do mercado, tem potencial para se generalizar para todos os setores da atividade econômica, analisou.
Fonte: http://oglobo.globo.com/economia/em-sentenca-inedita-justica-reconhece-vinculo-de-emprego-entre-motorista-uber-20926192
Mais um ponto importante é a questão do despejo no Brasil caso o anfitrião tenha a necessidade de retirar o hóspede do seu imóvel por força, após o prazo acordado de hospedagem.
No Brasil o despejo só é possível por meio de ação judicial, o que poderia levar meses. Essa questão chegou até mesmo a ser discutida em uma das reuniões da Comissão de Direito Imobiliário da OAB de Pinheiros em São Paulo.
Um ponto muito questionado é a permissão necessária para que se efetue a hospedagem. No site da empresa podemos observar uma consideração sobre a permissão do condomínio em receber hóspedes.
Vejamos:
(...) Consulte sua Associação de Moradores ou as regulamentações do seu condomínio para certificar-se de que sublocações não são proibidas ou que não haja nenhuma restrição em relação à hospedagem. Leia os termos da sua locação e consulte seu locador se necessário. Talvez seja interessante considerar a inclusão de uma cláusula em seu contrato que regule os interesses das partes e explique as responsabilidades e obrigações de todos os envolvidos.
Fonte: www.airbnb.com.br
Sendo assim, não haverá a possibilidade de conflitos entre as normas locais e o contrato do anfitrião Airbnb, a menos que essa sugestão seja ignorada.
Além disso, também observamos que a empresa tem a preocupação da verificação com as devidas taxas e impostos locais:
(...) Certifique-se de checar todos os impostos locais ou licenças/alvarás de funcionamento que possam ser necessárias. Isso talvez inclua impostos de ocupação e de vendas, outros impostos de transações como o Imposto Sobre Valor Agregado (IVA) ou Impostos sobre Bens e Serviços (ex: ICMS), ou imposto de renda.
Fonte: www.airbnb.com.br
Existe ainda um seguro contra danos no imóvel para segurar o anfitrião de possíveis prejuízos:
(...) A Garantia ao Anfitrião oferece uma proteção de até R$3.000.000 em danos no mundo inteiro. Os pagamentos estão sujeitos a certas condições, limitações e exclusões. Para obter mais detalhes, leia Termos da Garantia ao Anfitrião.
Fonte: www.airbnb.com.br
Como funciona o Seguro :
(...) Em caso de emergência, o anfitrião deve primeiro entrar em contato com a polícia, com os serviços de emergência ou com as autoridades relevantes. Depois, deve entrar em contato com Atendimento ao Cliente. Quando a situação não é uma emergência, o anfitrião deve entrar em contato com o hóspede para informá-lo sobre a queixa e tentar negociar uma resolução antes de enviar uma queixa oficial. Se o anfitrião e o hóspede não conseguirem chegar a um acordo, o anfitrião deve rever com atenção o Termos da Garantia ao Anfitrião e determinar se é elegível antes de enviar uma nova solicitação ao Airbnb. Os Anfitriões deverão fazer suas solicitações até 14 dias após o checkout do hóspede, ou antes que o próximo hóspede faça o check-in, o que acontecer primeiro.
(...) O que não está protegido
A Garantia ao Anfitrião não deve ser considerada como substituta de ou mais importante que um seguro de imóvel próprio ou alugado. A Garantia ao Anfitrião não protege:
• dinheiro e numerários
• animais de estimação
• responsabilidade civil
• áreas comuns ou compartilhadas
Alguns tipos de propriedade como, por exemplo, jóias, coleções/itens de coleção e objetos de arte têm proteções mais limitadas. Os anfitriões devem guardar em segurança ou remover esses objetos de valor ao alugar o espaço e devem considerar a possibilidade de contratação de um seguro independente para cobrir este itens. A Garantia ao Anfitrião não protege contra desgastes que podem acontecer naturalmente.
Fonte: www.airbnb.com.br
Mesmo assim, ainda permanece a discussão sobre as responsabilidades que o Airbnb deve ou não assumir em negócios realizados no Brasil. Pelo que, seguindo o hábito brasileiro de criarmos leis para tudo, foi criado um projeto de lei, de autoria do Senador Ricardo Ferraço para tipificar a chamada locação por temporada, que não seria um contrato de aluguel tradicional, o projeto de lei nº 748, de 2015:
(...) Altera a Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991 para atualizar o regime da locação para temporada, disciplinando a atividade de compartilhamento de imóveis residenciais por meio de sítios eletrônicos ou aplicativos.
Para justificar o projeto de lei, o Senador, muito assertivamente em meu ver, se baseou nas novas tecnologias Ponto-a-Ponto (P2P).
Nos últimos anos, diferentes setores da economia têm sofrido fortíssimas alterações oriundas das chamadas tecnologias peer-to-peer, que permitem que os usuários se conectem diretamente por meio de plataformas virtuais que viabilizam a troca de informações e a celebração de contratos em tempo real.
Exemplo desse fenômeno é o mercado de turismo, que vem experimentando importantes mudanças decorrentes de empresas que propiciam, por meio de soluções tecnológicas, conexão direta entre hóspedes e proprietários de residências, aumentando enormemente o rol de opções do viajante moderno e proporcionando aquilo que vem se convencionado chamar de compartilhamento de casas (home sharing).
Fonte: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/124165
Conclusão:
Parece ser muito difícil competir economicamente em um país onde tributar é mais importante do que valorizar os novos negócios, que injetam dinheiro na economia local e oferecem melhores e mais variadas possibilidades de serviços aos usuários finais.
Esses entraves jurídicos também dificultam a evolução financeira de um mercado que não se abre a inovações que já existem no mundo todo e que são provenientes de tecnologias já utilizadas por nossos próprios cidadãos.
Dessa forma, enquanto nossos governantes não abrirem as mentes para as novas vertentes de prestações de serviços, em sua grande maioria digitais, tentando colocar essas novas vertentes sob a tutela de normas jurídicas antiquadas e inflexíveis, que penalizam investidores e empreendedores, ficaremos sempre um passo atrás em relação ao resto do mundo.
Bernardo dos Santos
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