Bengalando por São Paulo 4
Nesta autobiografia o colunista Renato Barbato dividiu com o público do Pró Trabalhador como foi sua experiência mesmo tendo ficado cego de conseguir romper barreiras e bengalando por São Paulo se libertar de todos os paradigmas seus e de outros e conquistar os seus sonhos e o seu espaço na sociedade.
Publicado: 28-9-16.
Colunista: Renato Barbato é jornalista, palestrante, locutor, apresentador no programa Papo no Balcão, Arquiteto Urbanista, graduado pela Faculdade Belas Artes-SP e Técnico Eletrotécnico. Enquanto liderança atuou no Grupo de urbanismo da entidade e como diretor na modalidade Técnico (entre 2001 a 2003). Movimento Cidade Para Todos (Fundador e representante), Vice-coordenador do GT Acessibilidade (em 2011), representante titular do IAB/SP na CPA Comissão Permanente de Acessibilidade do Município de São Paulo (desde 2011). CADEVI Centro de apoio ao deficiente visual é associado (desde 2013) e conselheiro (de 2014 a 2017).
Foto: Edi Sousa Studio Artes
Sou natural de São Paulo, capital, onde tive uma infância como qualquer outro menino da década de 1970.
Joguei futebol, rodei peão, joguei bolinha de gude, será que as novas gerações sabem o que é peão ou bolinha de gude? Andei de bicicleta, enfim, fui um verdadeiro moleque.
Na adolescência, quando com 15 anos descobriram que eu tinha glaucoma hereditário, minha família paterna tem o problema que aparece justamente nessa época da vida, resolvi que eu iria viver, sem me preocupar com os efeitos que a doença poderia trazer.
Quando me formei no colegial técnico, decidi que não iria mais estudar, eu não gostava de aprender algo que sabia jamais utilizaria na minha vida, pensamento que mudou aos 26 anos.
Nessa idade eu estava trabalhando na Caixa Econômica Federal, junto ao SFH Sistema Financeiro da Habitação, e resolvi que queria trabalhar com construção civil, algo que desde a minha formação técnica me empolgava, como não era muito chegado à matemática, resolvi fazer arquitetura, pensando que ela não tinha nada ligado a essa matéria.
Doce engano, além de ter muito a ver, também comecei a gostar da danadinha, porque comecei a entender onde tudo que eu havia visto no ginásio e no colégio poderia ser utilizado.
Claro que nesse período eu não estava nem aí para o glaucoma, fiz a faculdade, curtia a noite e nem pensava em me tratar.
Logo que me formei, acabei entrando em um plano de demissão voluntária da Caixa, para investir na minha profissão de arquiteto e urbanista.
Não achava justo ficar trabalhando em um lugar que, mesmo gostando muito, não me daria à possibilidade de progredir no que realmente eu estava preparado, a minha nova profissão.
Atuei com projetos, principalmente de lojas de Centros Comerciais, até o ano de 2005, quando além do glaucoma, descobriram uma catarata avançada no meu olho.
Parei de dirigir, afinal não estava conseguindo ver detalhes e não queria colocar a vida de outras pessoas em perigo.
Fiz as cirurgias, que foram um sucesso, mas, depois de nove dias um acidente colocou a cirurgia do glaucoma a perder.
Tive de fazer cinco cirurgias num curto espaço de tempo, o que acarretou a perda da visão.
Ainda com esperança, colocada pela equipe médica, esperei por ano e meio o retorno da visão, até que, um raio veio sobre minha mente e abriu meus pensamentos.
Eu não iria mais enxergar.
Comecei a procurar reabilitação e o que encontrei foram cursos sofríveis, que pouca coisa ou quase nada agregaria aos meus conhecimentos.
Cursei o Braille, tentei, mas não tenho fluência no método, mas o que teve de importante nesse período foi conhecer uma pessoa, que vendo eu não ter mobilidade e nem perspectiva de tê-la num curto espaço de tempo falou:
Renato, compra uma bengala que eu te ensino a andar sozinho.
Foi o que fiz, na aula seguinte lá estava eu com a bengala e todo ansioso para o início da aula informal.
Quando falei ao homem que estava pronto ele me respondeu:
Faça uma varredura grande para sentir o que está ao seu lado.
Perguntei:
Sim, e depois?
Ele me disse:
Só isso.
Desde então comecei a bengalar por São Paulo a fora, sem parar e sem depender da caridade de entidade alguma.
Foi muito fácil, não sei se pela minha formação, ou por não ter passado pelas aulas que aterrorizam o coitadinho do ceguinho.
Penso que por ambos, sempre que converso com deficientes, tenho relatos que os instrutores colocam medo na pessoa com deficiência visual, falando de perigos que não existem.
Por isso é que falo a todos, quando quiserem saber algo sobre a deficiência visual, conversem com um deficiente visual, não com um enxergante que fala pelo taducho do cegueta.
Afinal, eles estão ensinando coisas que, duvido, teriam coragem de fazer se caso de uma hora para outra tornassem deficientes visuais.
Estou aí, na batalha, remando contra a maré, porque no nosso país a discriminação é enorme, velada, mas enorme.
Ninguém assume devido ao politicamente correto, se alguém falar que não concorda, será execrado em praça pública.
Penso que quase escrevi uma bíblia sobre a minha vida, mas é isso, certamente as experiências que tenho dariam um livro sagrado, e, deixando bem claro, não sou santo, nem candidato a santo, apenas uma pessoa que quer viver a vida como qualquer outra que todos afirmam ser normal.
Outras informações:
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