Governo acuado e a reforma política
Por muito pouco o PT não foi desalojado do poder nas últimas eleições. A presidente Dilma Rousseff foi reeleita, mas ficou evidente a enorme insatisfação da sociedade ao seu governo. Se a atual gestão não for capaz de promover mudanças de grande envergadura, os próximos quatro anos ficarão marcados por uma profunda crise política e por derrotas petistas fragorosas nos próximos pleitos.
Prevendo o pior para seu segundo mandato e a clara possibilidade de derrotas contundentes nas eleições municipais de 2016 e no pleito presidencial de 2018, Dilma tratou de discursar em defesa de reformas importantes, sendo a política uma delas. Nos últimos anos sua gestão foi omissa em relação ao encaminhamento de uma nova formatação das regras políticas brasileira, cujo debate se arrasta há pelo menos vinte anos. Agora acuada, a presidente diz que vai levá-la adiante.
A reforma política é crucial para o Brasil. O discurso da presidente é oportuno para colocá-la na agenda a partir do ano que vem. Mas, qual seria a essência do projeto que o PT considera ideal?
O Brasil precisa de um tratamento de choque na política e na administração pública. Há anos proponho algumas diretrizes que julgo indispensáveis para uma reforma nos moldes que o país necessita. Os pontos essenciais seriam:
1) financiamento exclusivamente público de campanhas eleitorais, para desestimular negociatas com financiadores privados;
2) voto distrital (preferencialmente misto) para aproximar o eleitor do eleito e proporcionar mecanismos mais eficientes de mútuo conhecimento e fiscalização;
3) radical redução dos cargos de livre provimento na administração pública, aqueles ocupados por pessoas indicadas por políticos e que não precisam de concurso, para assim manter uma burocracia administrativa profissional;
4) limitações na remuneração de cargos eletivos no Legislativo (vereadores, deputados e senadores), com radical redução (e até mesmo eliminação) de rendimentos fixos, mantendo apenas reembolsos de custos incorridos no exercício da função, para evitar a profissionalização da política;
5) proibição de reeleições sucessivas também para o Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para estimular a rotatividade e evitar a acomodação dentro da atividade pública eletiva;
6) impedimento ao exercício de funções executivas por detentores de mandatos legislativos para garantir a plena independência entre os poderes;
7) obrigatoriedade de abertura automática dos sigilos fiscal e bancário de todos os candidatos a cargos políticos e de administradores públicos, independentemente de autorização judicial, para coibir a corrupção;
8) permissão para candidaturas independentes.
Os itens listados são fundamentais para uma reforma política no Brasil. São aspectos que vão fortalecer a democracia e contribuir para eliminar práticas ilícitas que dilapidam a ética no país. São mudanças necessárias para remodelar os parâmetros comportamentais da classe política brasileira. A questão que fica é: será que o governo tem coragem de apoiar todos os pontos citados?
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Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único. É Subsecretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo.