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DESAPOSENTAÇÃO

Descrição de imagem: Patricia Evangelista, veste uma blusa verde com detalhes de renda e uma calça azul, esta com os cabelos presos. Fim da descrição de imagemNa coluna desta semana, Patricia Evangelista, advogada especialista em Direito Previdenciário afirma: “A desaposentação é possível, e, em caso de procedência da ação judicial, pode gerar direito na alteração do valor das parcelas vincendas (futuras) e nas parcelas vencidas (atrasadas) dos últimos 05 (cinco) anos”, explica.
 
 
Publicado: 2907/15
Foto: Edi Sousa e Nalva Lima Studio Artes
Colunista: Drª Patricia Evangelista, professora e advogada especialista em direito previdenciário, mestre em direito previdenciário na PUC-SP.
 
Desaposentação, reaposentação ou troca de aposentadoria trata-se de um direito onde o segurado que se aposentou e continuou contribuindo ao INSS, requer, através de uma ação judicial, a renúncia do atual benefício para a concessão de um novo mais vantajoso (comprovado por cálculo), aproveitando assim, o histórico de contribuições do benefício atual, somado as contribuições pagas ao INSS depois de aposentado, ou seja, solicitando um novo benefício de valor superior ao que percebe.
O cálculo para comprovar a melhora no valor do benefício, pode se dar da seguinte forma:
 
- todas as contribuições do inativo são aproveitas, incorporadas e implementadas na nova aposentação, inclusive as contribuições que ele verteu ao INSS, após a concessão de sua aposentadoria;
 
- recálculo do fator previdenciário ou inclusão do fator previdenciário positivo, pelo fato de o segurado estar mais velho hoje em comparação a data da concessão daquele primeiro benefício, uma vez que, naquela época, o fator previdenciário só prejudicava a vida do aposentado porque o mesmo aposentou-se “novo” ou com menos idade, e por isso, tem seu benefício cada ano mais achatado;
 
- o valor do teto da Previdência Social que hoje está bem mais elevado que o teto da época em que o segurado requereu sua aposentação. O atual teto do INSS é levado em consideração por ocasião do recálculo quando é requerido a Desaposentação.
 
A desaposentação, visando novo benefício, mais vantajoso ao segurado, em momento algum causa qualquer lesão à Previdência, visto que a vantagem maior alcançada na nova aposentadoria é fruto das contribuições que o contribuinte, já beneficiário, destinou à Previdência.
 
É de notório conhecimento que a Seguridade Social, a quem se destina os recursos provenientes das contribuições dos segurados abrange, nos termos da Constituição, a Previdência Social, a Saúde e a Assistência Social.
 
Mesmo diante das finalidades da Seguridade Social e por mais solidário que seja nosso Sistema Previdenciário, as alíquotas de contribuições são calculadas de forma que mantenha seu equilíbrio financeiro, prevendo os gastos com a saúde, assistência social e os benefícios decorrentes dos riscos do labor, bem como os relacionados à aposentadoria.
 
Nesta circunstância, mesmo depois de aposentado, o contribuinte que persiste em exercer suas atividades continua a contribuir com as mesmas alíquotas impostas àqueles que ainda poderão usufruir todos os direitos e garantias da Seguridade Social, fato que demonstra ser um contrassenso.
 
Não bastasse isso, o aposentado contribuinte já não receberá a devida contrapartida, uma vez que não poderá acumular aposentadorias, bem como, não será permitido o recebimento conjunto de benefício de aposentadoria com: auxílio-doença, auxílio-acidente, seguro-desemprego, benefícios assistenciais pecuniários, dentre outros, salvo as exceções previstas por lei.
 
De qualquer forma, a recíproca também é verdadeira, pois não se pode pagar por uma coisa e não ter direito ao(s) benefício(s) que ela pode gerar, sendo que, o Segurado, mesmo estando aposentado continuou vertendo contribuições ao sistema e, consequentemente alimentando a Previdência Social com as contribuições vertidas ao sistema.
 
Portanto, a obrigação de pagar, sem qualquer benefício em troca, gera uma descompensação, que foge a qualquer lei que esteja em vigor, pois, tal situação pode ser visualizada como uma caixa que entra contribuições e sai prestações, seria inócuo pensar, na entrada de contribuições, sem retirada de prestação, já que o aposentado que continua laborando, não tem direito a qualquer prestação da Previdência Social, quando encontra-se nessa situação, excetuando-se os casos previstos por lei.
 
Sob este enfoque, é perfeitamente compreensível o direito do contribuinte de requerer a complementação de seu benefício previdenciário, averbando as novas contribuições realizadas após sua aposentação, através do instituto da desaposentação, para que aufira benefício mais vantajoso, majorando de forma coesa e justa os índices anteriormente aplicados para a concessão do atual benefício.
 
Para aclarar a viabilidade atuarial da desaposentação importante socorrer-se mais uma vez  dos entendimentos de Fábio Zambitte Ibrahim, na obra já exaustivamente mencionada, nos seguintes termos:
 
“ Do ponto de vista atuarial, a desaposentação é plenamente justificável, pois se o segurado já goza de benefício, jubilado dentro das regras vigentes, atuarialmente definidas, presume-se que neste momento o sistema previdenciário somente fará desembolsos frente a este beneficiário, sem o recebimento de qualquer cotização, esta já feita durante o período passado”.
 
“Todavia, caso o beneficiário continue a trabalhar e contribuir, esta nova cotização gerará excedente atuarialmente imprevisto, que certamente poderia ser atualizado para obtenção de novo benefício, abrindo-se mão do anterior de modo a utilizar-se do tempo de contribuição do passado. Daí vem o espírito da desaposentação, que é a renuncia de benefício anterior em prol de outro melhor.” (grifei)
 
Ressalva ainda:
 
“ Nesta hipótese, o ideal seria a legislação prever revisão do benefício original, em razão do novo período contributivo à semelhança do que ocorre em diversos países.”
 
“ Da mesma forma, caso o segurado deseje ingressar em novo regime de previdência, também não há impedimento atuarial para o mesmo, pois o RGPS irá deixar de efetuar os pagamentos ao segurado, vertendo recursos acumulados ao regime próprio, mediante compensação financeira. Aqui também inexiste prejuízo ao RGPS, pois ainda que o segurado já tenha recebido algumas parcelas do benefício, tal fato não terá impacto prejudicial, pois o montante acumulado será utilizado em período temporal menor, já que a expectativa de vida, obviamente reduz-se com o tempo”.
 
A título exemplificativo, em Direito Comparado, pode-se citar o que acontece em Portugal, onde depois de aposentado, é permitida a cumulação de aposentadoria, e a partir do 1 (um) dia de cada ano, seu benefício é reajustado na proporção das novas contribuições efetuados no anterior. Já no Canadá, após a aposentadoria é necessária a continuidade das contribuições, porém este valor será utilizado para recálculo de seu benefício até que este alcance o valor máximo permitido para os benefícios.
 
Em síntese, resta sobejamente comprovado que o instituto da desaposentação não traz lesão alguma à relação de custeio e pagamento de benefícios, sendo o benefício pleiteado custeado anteriormente pelo próprio beneficiário, respeitando plenamente o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial.
 
Outro ponto elementar que envolve o tema em discussão está relacionado à necessidade ou desnecessidade da devolução das parcelas percebidas.
 
Muito embora, exista entendimento pela devolução das parcelas percebidas, tem-se que o entendimento correto é que as mesmas não devem ser devolvidas.
 
Para embasar a afirmativa acima descrita, importante compreender que os regimes previdenciários públicos brasileiros não são regimes de capitalização individual, ou seja, de acumulação de capitais em conta individual, variando conforme o valor e o tempo de acumulação, não há que se falar em restituição, posto que o custeio é realizado dentro do sistema de pacto intergeracional, com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos, ou seja, o Poder Público não aplica os recursos advindos das contribuições dos segurados visando o futuro, ao contrário do sistema de capitalização, mas utiliza-os no momento de seu efetivo pagamento. Portanto, não há que se falar em restituição.
 
Neste sentido, são os entendimentos de CASTRO e LAZZARI , na obra jurídica “ Manual de Direito Previdenciário”, pag. 509:
 
...Entendemos que não há necessidade da devolução dessas parcelas, pois não havendo irregularidade na concessão do benefício recebido, não há o que ser restituído. Como paradigma, podemos considerar a reversão, prevista na Lei nº 8.112/90, que não prevê a devolução dos proventos percebidos. (Grifei)
 
Na mesma linha de raciocínio, comunga o jurista IBRAHIM, em sua obra “ Desaposentação: o caminho para uma melhor aposentadoria”, pág. 60/62, ao afirmar:
 
“ ...que não há se falar em restituição de valor algum, pois o benefício de aposentadoria, quando originalmente concedido, foi feito com o intuito de permanecer durante o restante da vida do segurado. Se este deixa de receber as prestações vindouras, estaria, em verdade, favorecendo o regime previdenciário”. (grifo ausente do original)
 
E, pondera ainda o mesmo doutrinador:
 
“ ... em caso de migração entre regimes também será desnecessária a restituição de valores, vez que o sistema previdenciário brasileiro adotou a sistemática de repartição simples (os da ativa sustentam os da inatividade para serem sustentados no futuro), aduzindo ainda tratar-se de benefício previdenciário, com características de verba alimentícia, razão pela qual não se poderia exigir a devolução de qualquer valor devidamente recebido 
e quanto a desaposentação no mesmo regime parace que a melhor solução também é a inexistência de restituição de qualquer valor, pois, na prática, tem-se mero recálculo do valor da prestação em razão das novas cotizações do trabalhador aposentado.
 
Em resumo, considera-se indevida a restituição dos valores, conforme raciocínio jurídico lógico abaixo descrito:
 
1- Se não há irregularidade na concessão do benefício não há que se falar em necessidade de devolução das parcelas percebidas;
 
2- Se a própria lei se silencia acerca da devolução o segurado não esta obrigado a repor o status quo ante;
 
3- Como paradigma para a não devolução pode-se utilizar do instituto irmão da reversão do servidor público, previsto na Lei nº 8.112/90, que prevê a reversão mais não prevê a devolução dos proventos percebidos.
 
E, por último, tendo as parcelas pagas do benefício, trato alimentar, estas são indiscutivelmente devidas no tempo em que o benefício se perdurou, não havendo razão nem legitimação para sua devolução.
 
Considerando-se a aposentação devidamente concedida, após preenchimento dos requisitos necessários, sob o amparo da lei vigente, com o intuito duradouro que o trabalhador aposentado somará cotizações futuras às anteriores, para pleitear nova aposentadoria, inexiste qualquer prejuízo ao regime previdenciário e a terceiro, eis que o acréscimo da aposentadoria decorrerá das cotizações pós-aposentação no mesmo regime.
 
Não havendo prejuízos ao regime previdenciário e a terceiros, não há que se falar em restituição de qualquer valor recebido a título de proventos, quando legalmente concedida à aposentação.
 
Neste sentido vem decidido a Jurisprudência de maneira consolidada, acerca do tema, in verbis:
 
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. DIREITO À RENÚNCIA. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM RECÍPROCA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS RECEBIDAS.
1. A aposentadoria é direito patrimonial disponível, passível de renúncia, portanto. 
2. A abdicação do benefício não atinge o tempo de contribuição. Estando cancelada a aposentadoria no regime geral, tem a pessoa o direito de ver computado, no serviço público, o respectivo tempo de contribuição na atividade privada. 
3. No caso, não se cogita a cumulação de benefícios, mas o fim de uma aposentadoria e o conseqüente início de outra. 
4. O ato de renunciar a aposentadoria tem efeito ex nunc e não gera o dever de devolver valores, pois, enquanto perdurou a aposentadoria pelo regime geral, os pagamentos, de natureza alimentar, eram indiscutivelmente devidos. 
5. Recurso especial improvido. 
(STJ – REsp 692628 – DF – 6ª T. – Rel. Min. Nilson Naves – DJU 05.09.2005 p. 515)
 
Portanto, a desaposentação é possível, e, em caso de procedência da ação judicial, pode gerar direito na alteração do valor das parcelas vincendas (futuras) e nas parcelas vencidas (atrasadas) dos últimos 05 (cinco) anos.